Aprovado pelo MEC, o livro didático "Por uma vida melhor", da coleção "Viver, aprender", caiu na boca do povo. O motivo? A autora Heloisa Ramos considera correto se falar e escrever sem regras gramaticais. Imaginei que o tema seria um prato cheio em conversas apenas entre mestres e professores obedientes à norma culta.
Mas os exemplos lançados no livro, como o "nós pega o peixe", acabaram esquentando tanto a discussão que ela pipocou no meio leigo. A polêmica, contrários versus favoráveis à norma popular nas salas de aula, ficou ainda mais acalorada.
Foi nesse clima que ouvi uma babá e sua colega, que cuidavam de duas crianças numa pracinha, a falar do assunto e de seus próprios filhos estudantes em escola pública:
- Tu já pensou? Só criança de bacana vai ter direito de aprender certo.
- Brincadeira... Não botei minha filha na escola pra ela acabar igual eu!
Depois, ao parar na banca de jornal, fiquei na escuta numa roda de bate-papo. Um papeador insinuou que o livro em questão seria para justificar a falta de cultura do ex-presidente. A politização do tema não seguiu em frente porque um outro contrapôs, dizendo que Lula é "um comunicador popular".
Na verdade, estavam todos mais preocupados com a atitude da garotada daqui por diante. Alguém foi cruelmente taxativo: "Coitada da professora de português!"
A coisa é séria. Muitas vezes o aluno mais criativo e que desenvolve melhor uma redação não tem qualquer reconhecimento. Tira nota baixa e se sente desprezado. Por quê? Porque comete erros gramaticais. Se isso acontece por uma dificuldade originada na falta de instrução de sua família, então ele deveria merecer mais atenção do professor.
Há diferença entre escrever bem e escrever certo. Escrever bem é uma aptidão a ser valorizada e estimulada. Jamais desprezada. Já escrever certo depende de estudo e prática em gramática; a qual se aprende na escola e durante toda a vida. Até como uma forma de ascender socialmente. Falar certo, idem. Pessoas escolarizadas ou autodidatas são as que conseguem se expressar bem e certo.
E a linguagem popular? Caracteriza-se por ser livre, diversa: em regionalismos, dialetos, gírias, internet... Em prosa, verso, cordel, letra de músicas. Também faz parte da ciência linguística.
O livro "Por uma vida melhor" confunde as funções de um linguista com as de um professor de português. Numa sala de aula, um professor tem que ensinar o aluno a gostar de aprender. Ponto. (Sem preconceito.)
Ateneia Feijó é jornalista
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